Complexo de Abraão
Moisés Almeida
Na história de Abraão, há um momento crucial, um vexame divino, Deus agora pede a Abrãao o que de mais importante lhe havia dado – seu filho. Abraão à princípio deve ter estranhado o pedido, era o seu filho a grande promessa de Deus, sua descendência seria bendita, era o nascimento não apenas de um menino mas de um povo. Será que Deus tinha mudado de idéia, e agora cancelaria sua promessa? Como se cumpriria o “multiplicarei a tua descendência, e em ti serão benditas todas nações da terra”? Como Deus poderia dar e retirar com tanto simplismo? Brincar com a sensibilidade de um ancião que na sua velhice tinha tido a benção de ter um filho com a mulher que amava?
O que se sabe é que Abraão crê em Deus, lhe é obediente, e porisso vai ao Moriá oferecer em sacrifício o seu filho, o seu único. Na sua terra natal, os cultos idólatras faziam oferendas humanas, o que não deve ter impressionado a pedido de Deus, Abraão não tinha nenhum problema ‘teológico’ com isso, que lhe era dolorido, era o fato de ser o seu filho! Mas ele não questiona a natureza do sacrifício, nem o objeto desse sacrifício. Ele simplesmente vai.
O final da história todos sabemos, Deus impede o sacrifício humano de Isaque e um cordeiro é oferecido a Deus em seu lugar. Final feliz – happy end.
O que chamo aqui de Complexo de Abraão, é o fato de muita gente achar que Deus é um ser tão egoísta, que não se pode gostar de nada profundamente, sem que Deus queira logo acabar com a festa, e aí tem gente que tem medo de amar, e de gostar, porque Deus pode ficar zangado, “afinal será que José gosta mais do filho do que de mim? Não pode, vou matar o filho dele, e assim o amor dele, será somente pra mim”. É um Deus passional, ciumento, quase um diabo. Um Deus que não permite que as pessoas se gostem, se amem, ou sejam felizes. E tem gente que ainda diz: tá bom pra ser verdade. Deve vir algo ruim depois.
Essa concepção de Deus não é, e nem nunca foi a imagem do Deus eterno, que é amor. E que sua justiça, ainda assim é derramada em amor e compaixão pelas suas criaturas. Não podemos fazer a teologia do Isaque para o nosso cotidiano, aquilo foi um caso de Deus com Abraão, e só a ele importa, e também foi a prefiguração da morte de Cristo. O que passar disso é terrorismo evangélico dos Bin Ladens da religião, é manipulação de consciências.
Deus quer que sejamos felizes sim. E não há nada errado em amar. O amor que devotamos a um filho, esposa, pai, mãe, é diferente do amor que temos a Deus. No novo testamento, escrito em grego, se faz a diferênça da palavra ‘amor’ pra cada ocasião, usa-se uma palavra específica para dizer que se ama a Deus, mulher, o filho, o irmão. Em português usamos a mesma palavra, porisso a banalização e não compreesão do significado.
Quando Jesus disse que quem não deixar pai, mãe, irmãos, fazendas, por amor dele não era digno dele, não estava querendo sufocar o amor entre familiares, mas que haveria momento em que deveria se fazer uma escolha, e numa escolha, deveria se colocar Jesus em primeiro lugar.
Amar a Deus sobre todas as coisas é também amar o próximo, pois assim pergunta João, ‘se você não ama seu irmão/próximo que vê todo dia, como amará a Deus que nunca viu?’. O exercício do amor a Deus é amar o seu próximo, pai, mãe, irmão, inimigo, como demonstração desse amor de Deus que invade nossas almas. Quem ama conhece a Deus porque Deus é amor. Não dá pra amar verticalmente apenas, o amor tem que ser demonstrado horizontalmente – com os semelhantes – e assim cumpriremos a lei de Cristo.
Há muita gente nas igrejas que dizem que amam a Deus, mas não socorrem seus irmãos, são gente que ora de dia e de noite pra ter ‘revelações, sinais, profecias’ que conseguem ver anjos voando dentro da igreja, mas não conseguem ver o irmão necessitado sentado ao lado! A pessoa consegue ver anjo e não consegue ver a necessiade do seu irmão? Mil vezes desejo o contrário. Uma espiritualidade dessa é absolutamente descartável.
No último dia a Bíblia diz que Jesus não vai perguntar quantas revelações você teve, ou quantas visões ou quantas profecias. Ele vai pergunar se destes de comer ao faminto, de beber ao sedento, de vestir ao nú, se fostes visitar o enfermo e o encarcerado, pois ‘quando fizeste uma dessas coisas aos mesus pequeninos a mim me fizeste’.
Não tenha medo de amar, de dizer que ama, aos que estão à sua volta, a seu filho que precisa de carinho, a sua mãe que precisa de ouvir um ‘te amo’, e a todos que necessitam de um pouco de carinho nesta vida, isto é bom pra você também, pois amar faz bem. Vamos nos curar desse ‘complexo de abraão’, onde se tem medo de amar, e se faz de conta que não se ama, pra Deus não se enciumar e acabar por tirar o objeto de seu amor. Esse tipo de deus é na verdade o diabo.
Deus é amor, e todo o que ama conhece a Deus.
Moisés Almeida.
Um comentário:
A Paz do Senhor Jesus!
Gostei do seu blog! Que Deus continue a te usar!
Abraços e feliz 2006!
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